domingo, março 19, 2006

Palavra-Barro

De tudo o que gravita
ficou-se-me o Tempo
em que fui terra, pedra dura,
para me vires tu juntar a sede
e da matéria inerte
dares-me vida.

Com as tuas mãos de oleiro,
demiurgo inconsciente,
moldavas-me as formas,
cingias-me o corpo com ternura
(até me fizestes uma pintura!)

Mas olvidado foi de teu pensamento
que à matéria informe
não se lhe quebra o modelo.
Hoje caída, despedaçada,
sou caco disperso, vazio,
metade de algo, nada.

A.C.

sexta-feira, março 17, 2006

pena capital

a Mário Cesariny de V.

o amor é
um mar.

eu

uma tempestade.


Rui Alberto

quarta-feira, março 15, 2006

(a partir de omoplata de mulher)

Sentada na luzidia primeira prata entre a areia e o mar
os adormecidos olhos o rosto abraçando a fresca música do sol caindo
a poente Estás sentada como quem sempre aguarda a
azulínea mão das eternas e iniciantes noites de um mundo outro
O corpo abandonadamente azul lua o corpo nocturno o embrionário olhar
já das impossíveis cores da nossa idade Os inomináveis
acordes que nos conduzem a uma praia como esta e
nos fazem esperar esperar
esperar a mágica metamorfose inaugurada pelo alado gesto de Eva
no quimérico e silente mover dos ombros Então ganhas asas e
como no poema de Eugénio partes com as aves.

(inédito, 2005)